É lugar-comum no Brasil o pensamento de que a justiça só pode ser feita quando a devida ação judicial é formalizada. Naturalmente, essa máxima tem sua aplicação em determinados casos mais complexos. Mas não pode ser uma referência para todo e qualquer tipo de conflito — especialmente aqueles que tratam da recuperação de crédito.
Cobranças por inadimplência de cartões de créditos, serviços telefônicos, tarifas bancárias ou quaisquer outras negociações de dívidas são, muitas vezes, levadas adiante por meio de ações judiciais formalizadas.
Essa prática é uma das razões que leva à estafa do sistema judicial brasileiro e à morosidade do andamento de processos. Culturalmente, acredita-se que a intervenção de agentes jurídicos é um fator tão eficaz quanto intimidador, o que, acima de tudo, prejudica a relação entre as partes e restringe as chances de conciliação.
E a conciliação é, sem dúvidas, uma poderosa ferramenta de pacificação social e, consequentemente, de diminuição de demandas para os agentes judiciários. Ela encontra sua mais frequente manifestação nas cobranças pré-processuais.
Em outras palavras, a cobrança pré-processual é a mediação amigável entre as partes, sendo sua conciliação intermediada por agentes comunitários, juízes leigos e/ou conciliadores treinados especialmente para essa finalidade.
Há três razões principais que fazem da cobrança pré-processual uma prática interessante para as partes envolvidas:
1. Custo zero para distribuição
Sem a incidência de significativas somas de custas judiciais, a cobrança pré-processual é um procedimento substancialmente mais acessível. Os custos, quando existentes, são normalmente relacionados a envios postais de cartas-convite para a negociação;
2. Obtenção de título executivo judicial
O acordo celebrado entre as partes passa por homologação judicial e tem status legal de instrumento particular de composição de conflitos. Naturalmente, seu não cumprimento pode levar a parte autora a buscar o devido processo judicial;
3. Possibilidade de manutenção da relação com os clientes
Instituições de serviços financeiros que buscam o acordo pré-processual, por exemplo, não apenas demonstram boa vontade para com seus devedores, como também passam a mensagem de que estão abertas ao diálogo. Do outro lado, o cliente/devedor também desenvolve essa percepção ao encontrar um ambiente mais amigável e neutro para negociar seus débitos.
O que está em jogo aqui vai muito além da mera recuperação de crédito friamente praticada por empresas de cobrança. O recurso do atendimento pré-processual é uma mediação neutra que contempla tanto os interesses dos credores quanto as necessidades dos devedores, sem que a contenda resulte em algo desgastante para as partes.
Também cabe aos agentes jurídicos o fomento a esse tipo de prática sempre que for cabível. Dessa forma, o processo judicial apenas pela formalização dará lugar à reeducação das partes envolvidas em conflitos de tal natureza — não com o intuito de que um se sobreponha ao outro, mas sim, com a clara intenção de que as relações sociais possam ser a base para a superação desse tipo de problema.
Antonio Rodrigo Sant’Ana
Sócio
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